Entrevista com… Patrícia F. N. Faísca

Artigo na revista mais prestigiada na área da Biologia Computacional

O artigo “A Simulated Intermediate State for Folding and Aggregation Provides Insights into ΔN6 β2-Microglobulin Amyloidogenic Behavior” publicado em maio na PLoS Computational Biology, a revista mais prestigiada na área da Biologia Computacional, resulta de uma colaboração entre o grupo Protein Folding do Centro de Física da Matéria Condensada da Universidade de Lisboa, o grupo Molecular Modelling and Simulation, integrado no grupo de Química Inorgânica e Teórica do Centro de Química e Bioquímica de Ciências e a Universidade de Harvard. Sílvia G. Estácio, Heinrich Krobath, Diogo Vila-Viçosa, Miguel Machuqueiro, Eugene I. Shakhnovich e Patrícia F. N. Faísca assinam o artigo.

Patrícia F N Faísca, líder do grupo Protein Folding do Centro de Física da Matéria Condensada da Universidade de Lisboa e uma das autoras do artigo publicado na PLoS Computational Biology -  “A Simulated Intermediate State for Folding and Aggregation Provides Insights into ΔN6 β2-Microglobulin Amyloidogenic Behavior” -, em entrevista dá a conhecer este trabalho, que estuda as origens microscópicas, com recurso a simulação computacional, de uma patologia fatal: a amiloidose relacionada com a diálise e que afeta doentes com insuficiência renal grave.

Patrícia F. N. Faísca
Patrícia F. N. Faísca estuda os processos de folding e agregação de proteínas no contexto da biofísica computacional, bem como a relação destes processos com as chamadas patologias conformacionais
Fonte: Cedida por PFNF

Em que é que consiste o estudo?

Patrícia Faísca (PF) - Este estudo explora com recurso exclusivo à simulação computacional a origem molecular de uma doença conformacional designada por amiloidose relacionada com a diálise ou ARD (em inglês DRA ou Dialysis Related Amyloidosis). Esta doença, que afeta a maior parte dos pacientes com mais de dez anos de hemodiálise (cerca de 700.000 em todo o mundo), caracteriza-se pela inflamação e posterior destruição do tecido osteoarticular em consequência da deposição nesses tecidos de fibras amiloides da proteína beta-2-microglobulina (b2m). Compreender a génese molecular desta patologia é, pois, muito importante para encontrar uma solução/cura para a mesma. O nosso estudo explora a fase inicial do mecanismo de amiloidogénese das duas formas da proteína b2m que são encontradas nas fibras amiloides extraídas de doentes post-mortem, a forma wild-type e uma variante truncada que se chama DN6. Um aspeto relevante da fisiologia desta doença é um ligeiro abaixamento de pH (de 7 para 6.2) do líquido sinovial nos doentes de ARD.

Quando é que iniciaram os trabalhos?

PF - Os trabalhos tiveram início em janeiro de 2012 depois de dois elementos da equipa – eu e a Sílvia G. Estácio - termos regressado da “Gordon Research Conference on Protein Folding Dynamics”, que teve lugar nos EUA. Durante essa conferência tivemos oportunidade de ter uma longa conversa com a professora Sheena Radford (Universidade de Leeds, no Reino Unido) sobre a proteína b2m. Explicamos-lhe que tínhamos muito interesse em estender a nossa abordagem metodológica àquele sistema, e foi no contexto dessa conversa que nos foi sugerido o estudo da variante truncada DN6, com a qual ela própria tinha já obtido resultados muito interessantes. Em particular, tinha verificado através de experiências in vitro que um ligeiro abaixamento de pH para 6.2 (tal como o que acontece no líquido sinovial dos doentes de ARD) aumenta substancialmente o potencial amiloidogénico da variante DN6.

Ciências - Como é que surgiu esta colaboração?

PF - Este trabalho envolve duas colaborações. Uma colaboração de longa data entre o grupo liderado por mim e o professor Eugene I. Shakhnovich, da Universidade de Harvard, e uma colaboração local e recente entre o meu grupo e o grupo liderado por Miguel Machuqueiro, ambos da Faculdade. Esta segunda colaboração surgiu muito naturalmente porque os dois grupos da Faculdade têm know-hows complementares - que são ambos necessários para fazer um estudo completo do comportamento da proteína em questão - e interesses científicos convergentes. Em particular, as metodologias usadas e desenvolvidas no meu grupo permitem estudar alterações conformacionais de larga escala (como as que acontecem no folding e agregação de proteínas) enquanto que as metodologias desenvolvidas no grupo do Miguel Machuqueiro permitem avaliar os efeitos de pH na dinâmica de proteínas. Ambos os grupos estão interessados em estudar proteínas envolvidas em patologias humanas como é o caso da b2m.

Como é que tem corrido a investigação?

PF - A investigação correu muito bem. À medida que o tempo foi passando (e passou muito tempo desde que iniciamos a recolha de dados!) fomos obtendo resultados interessantes e consistentes o que contribuiu fortemente para nos encorajar a continuar um projeto que sabíamos a priori ia ser longo. Quando terminámos a análise final de todos os resultados (correspondentes a cerca de um ano e meio de cálculos computacionais) ficámos muito satisfeitos porque ficou claro que tínhamos ali uma “história” científica superinteressante alicerçada num trabalho científico de grande qualidade.

Quais foram os principais resultados alcançados?

PF - Obtivemos uma série de resultados importantes mas o mais interessante de todos foi termos encontrado uma explicação microscópica para o aumento do potencial amiloidogénico da DN6-b2m com o abaixamento de pH. Ou seja, conseguimos explicar porque é que a amiloidose é mais eficaz precisamente nos locais onde se acumula a proteína e onde a inflamação faz baixar o pH. O que acontece é que ao enrolar-se (ao “foldar”) para tentar encontrar o seu estado biologicamente ativo (o chamado estado nativo) a DN6-b2m passa por um estado intermediário que tem propensão a dimerizar iniciando a cascata de agregação. Esse estado é caracterizado pela existência de um região estrutural que se comporta como um “gancho pegajoso” flexível que tem a capacidade de “agarrar” proteínas que adotem uma conformação semelhante à sua e que são abundantes no caso da variante DN6. O que é perverso é que um abaixamento ligeiro de pH de 7 para 6.2 torna este “gancho pegajoso” ainda mais flexível aumentando a sua capacidade de “agarrar” proteínas com mais eficácia formando dímeros mais estáveis e cuja estrutura tem mais potencial para crescer, eventualmente dando origem às fibras amiloides.

Quais são os próximos passos da equipa?

PF - Um ano depois de termos dado início a este trabalho foi publicado na revista New England Journal of Medicine um artigo que reporta a existência de uma outra mutante da beta-2-microglobulina com interesse biomédico. De facto, foi detetada numa (única!) família francesa que sofre de uma amiloidose sistémica e hereditária (com sintomas de neuropatia autonómica) uma nova variante amiloidogénica da b2m. Neste momento já estamos a estudar esta nova mutante e os resultados obtidos até à data são bastante promissores. De facto parecem apontar para a existência de um estado intermediário do folding universal com potencial para desencadear a cascata de agregação em variantes diferentes da b2m.

Quer partilhar algum aspeto curioso ou singular desta investigação?

PF - Esta foi a primeira vez que submetemos para publicação um artigo que se foca numa proteína com interesse médico. Notámos que a competição por novos resultados com potencial para contribuir de forma significativa para a resolução deste problema é absurdamente feroz! É muito difícil fazer passar novas ideias e criar novos paradigmas quando o sistema que estudamos está associado a uma patologia humana.

Quem é Patrícia F. N. Faísca?

Atualmente é professora do Departamento de Física de Ciências e lidera o grupo Protein Folding do Centro de Física da Matéria Condensada da Universidade de Lisboa (CFMCUL), que estuda os processos de folding e agregação de proteínas no contexto da biofísica computacional, bem como a relação destes processos com as chamadas patologias conformacionais. A cientista que trabalha no CFMCUL desde o ano de 2008, colabora com o físico Eugene I. Shakhnovich desde 2006, no contexto de projetos financiados pela FCT. Após ter concluído, em 2002, o doutoramento em Física, na Universidade de Warwick, no Reino Unido, no âmbito do Programa Gulbenkian de Doutoramento em Biologia e Medicina, Patrícia F. N. Faísca foi bolseira de pós-doutoramento da FCT, durante cerca de quatro anos, primeiro na Universidade de Lisboa e mais tarde no Instituto de Tecnologia Química e Biológica da Universidade Nova de Lisboa.

Ana Subtil Simões, Gabinete de Comunicação, Imagem e Cultura
info.ciencias@fc.ul.pt
Seringas

Ensaio da autoria dos professores Manuel Carmo Gomes e Carlos Antunes.

uvas com a doença oídio

Estudo liderado por Ana Margarida Fortes, professora do DBV Ciências ULisboa e coordenadora de um dos grupos do BioISI Ciências ULisboa, está entre os cinco melhores artigos da Journal of Experimental Botany, uma prestigiada revista de investigação em plantas.

Maria Helena Carvalho de Sousa Andrade e Silva, professora aposentada da Ciências ULisboa, faleceu aos 94 anos, no passado dia 31 de outubro. A Faculdade apresenta sentidas condolências aos seus familiares, amigos e colegas.

Estrutura 3D da proteína S100B

Uma equipa internacional liderada pelo cientista Cláudio M. Gomes, professor do DQB Ciências ULisboa e coordenador do laboratório PMAB do BioISI, descobriu uma nova função para uma proteína do cérebro, que atrasa a formação de depósitos proteicos causadores de demências como a doença de Alzheimer. Guilherme Moreira, estudante de doutoramento em Bioquímica na Ciências ULisboa, orientado por Cláudio M. Gomes, é o primeiro autor do estudo.

 

Flores, livro e ampulheta

"Apesar de tudo, outubro foi um rico mês e novembro promete ser igual (...) O dia de amanhã, ainda que não esteja garantido, é uma série ininterrupta e eterna de instantes e é nosso". Mais uma rubrica em jeito de editorial, da autoria de Ana Subtil Simões, editora da Newsletter de Ciências.

Cérebro

"Para cada uma destas operações interessa estudar como nos vamos conduzir, e em que direção vamos prosseguir, logo quais são os princípios das coisas especulativas e os da imaginação",  in No Campus com Helder Coelho.

crianças numa visita ao laboratório

Ciências ULisboa recebeu, no passado dia 6 de outubro, 47 alunos do 4º ano, da Escola Básica Mestre Querubim Lapa, no âmbito do programa Escola Ciência Viva do Pavilhão do Conhecimento. A visita realizou-se no âmbito da atividade “Encontro com o cientista” e teve como anfitrião o professor do Departamento de Física, Rui Agostinho.

Campus da Faculdade

A Faculdade dá a conhecer uma vez mais a melhor ciência que se faz nesta centenária instituição. O Dia da Investigação da Ciências ULisboa realiza-se a 27 de outubro, no grande auditório, sito no edifício C3 e conta com uma sessão especial dedicada às Alterações Climáticas, área de investigação onde Ciências ULisboa é líder.

Luis Carriço, diretor da Ciências ULisboa e Maria de Jesus Fernandes, bastonária da Ordem dos Biólogos, assinaram no passado mês de setembro um protocolo de colaboração que visa a conceção, criação e desenvolvimento de cursos de especialização nas áreas de especialidade da Ordem, nomeadamente: Ambiente, Biotecnologia, Educação e Saúde.

Folha em destaque

Vanessa Mata, Miguel Baptista e Tiago Morais são os vencedores da edição 2021 do Prémio de Doutoramento em Ecologia - Fundação Amadeu Dias, organizado pela Sociedade Portuguesa de Ecologia (Speco). A entrega dos galardões deve ocorrer no próximo mês de dezembro, durante o 20º Encontro Nacional de Ecologia, na Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Viana do Castelo, em Ponte de Lima.

codigo html

“OS Diversity for Intrusion Tolerance: Myth or Reality?”, com coautoria de três investigadores da Ciências ULisboa, é um dos artigos distinguidos com o prémio Test-of-Time, atribuído em junho de 2021 pela DSN.

Logotipo da iniciativa - banner promocional

Entre 12 e 17 de outubro de 2021 realiza-se a primeira edição do FIC.A - Festival Internacional de Ciência, no Palácio e Jardins do Marquês de Pombal, em Oeiras. Ciências ULisboa está representada neste evento com dezenas de atividades.

logotipo das comemorações do centenário da licenciatura em engenharia geográfica/geoespacial

Este ano assinala-se o centenário da criação da licenciatura em Engenharia Geográfica/Geoespacial. Para comemorar a efeméride realiza-se a 22 de outubro de 2021, pelas 15h00, no grande auditório da Ciências ULisboa, uma Sessão Solene Comemorativa, organizada pela Faculdade em parceria com a Ordem dos Engenheiros.

Lagoa nos Açores

Um estudo multidisciplinar, da autoria de vários cientistas europeus e norte-americanos, reconstrói as condições em que os Açores foram habitados pela primeira vez e o impacto da presença humana nos ecossistemas.

mapas e dispositivos moveis

"A informação geográfica contextualiza um povo, uma comunidade ou um indivíduo no espaço que o envolve", escreve Cristina Catita, professora do DEGGE Ciências ULisboa, por ocasião das comemorações do centenário do curso de Engenharia Geográfica/Geoespacial.

banda desenhada

“O jogo das alterações climáticas” é o novo livro da autoria de Bruno Pinto (argumento), Quico Nogueira (desenho) e Nuno Duarte (cor). O lançamento do livro vai ter lugar na Ciências ULisboa, já no próximo dia 7 de outubro.

Logotipo Radar

Décima oitava rubrica Radar Tec Labs, dedicada às atividades do Centro de Inovação da Faculdade. A empresa em destaque é a Sowé.

"É mais uma vez com uma enorme alegria que constatamos que Ciências ULisboa foi reconhecida como faculdade de excelência, sendo escolhida por mais de nove centenas de alunos na 1.ª fase do Concurso Nacional de Acesso (CNA) ao ensino superior", escreve Pedro Almeida, subdiretor da Faculdade.

trevo

Todos os dias são bons para serendipidades. Todos os dias também são bons para ocasiões previstas e que produzem factos.

Clara Grilo

Clara Grilo é bióloga e tem desenvolvido estudos sobre o impacto das estradas na fauna silvestre, nomeadamente na abundância relativa, comportamento, mortalidade por atropelamento e risco de extinção em aves e mamíferos. É investigadora no CESAM Ciências ULisboa, mas também é uma alumna da Faculdade. Fique a par de como foi estudar nesta faculdade e o que a levou a ir para o estrangeiro.

Um lince Ibérico sub-adulto

Mais de 120 espécies de mamíferos terrestres são particularmente vulneráveis à mortalidade por atropelamento e várias populações podem extinguir-se em 50 anos se persistirem os níveis de atropelamentos observados. A declaração é de Clara Grilo, investigadora do CESAM Ciências ULisboa, que lidera a investigação e que resultou na publicação de um artigo na prestigiada revista científica Global Ecology and Biogeography.

A missão Sentinel marca uma nova era na observação da Terra com o Copernicus

"A deteção remota veio revolucionar a forma de observação da Terra (...) desde as câmaras acopladas a aviões (...) aos mais variados sensores a bordo dos diversos satélites que orbitam a Terra, estes equipamentos têm permitido a aquisição sistemática de grandes volumes de imagens da superfície terrestre, possibilitando a sua monitorização a um nível global, regional e local de modo a uma gestão mais sustentável", escreve Ana Cristina Navarro Ferreira, professora do DEGGE Ciências ULisboa, por ocasião das comemorações do centenário do curso de Engenharia Geográfica/Geoespacial.

Estrutura molecular do óxido aniónico [Mo7O24]<sup>6-</sup>, cuja dissolução apresenta propriedades oncocidas

Investigação conjunta entre o BioISI Ciências ULisboa, a CIC NanoGUNE e a Universidade de Glasgow permite um avanço no conhecimento sobre quimioterapias com óxidos de molibdénio e realça as nuances pelas quais os sucessivos equilíbrios de pH controlam a ação oncocida aparente do {Mo7}.

Cratera inativa em Cabo Verde

António Morais Romão Serralheiro, professor catedrático jubilado da Ciências ULisboas, faleceu no passado dia 25 de agosto. A Faculdade apresenta as sinceras e sentidas condolências aos seus familiares, amigos e colegas. Leia a homenagem de um dos seus antigos alunos, atualmente professor e investigador da Faculdade, José Madeira.

Ricardo Simões no laboratório

Ricardo Simões, antigo aluno da Ciências ULisboa e investigador pós-doutorado do Centro de Química Estrutural da ULisboa, é um dos vencedores do Prémio Franzosini 2020, e o primeiro cientista português a receber este galardão internacional, que devido à situação pandémica foi entregue este verão.

Pages