Entrevista com…


Ana Simões

O que é que simboliza para si o ato de escrita?

Ana Simões (AS) - Escrever é um processo muito importante. Ao escrevermos, as nossas ideias muitas vezes tomam contornos diferentes e tornam-se mais claras, é uma forma central de comunicação. A produção científica e a produção em História das Ciências, como uma das áreas do conhecimento que está em franco desenvolvimento, são áreas que naturalmente não se podem desenvolver sem que haja circulação e comunicação do conhecimento. A nossa “prática de laboratório” é basicamente a escrita, a reflexão, a coordenação de ideias. É uma tarefa essencial. Eu basicamente escrevo todos os dias.

Como é que correu a redação desta obra em parceria com Kostas Gavroglu, foi um trabalho difícil?

AS – Não, não foi um trabalho difícil. Aliás, é uma história muito interessante. Eu já colaboro com este meu colega desde a altura do meu doutoramento. Conheci-o precisamente quando estava a escrever a tese de doutoramento. Percebi que havia uma outra pessoa, um outro historiador das ciências a trabalhar em tópicos não exatamente iguais, mas cuja interface era muito grande e fiquei cheia de medo, tive receio que houvesse uma interface, enfim, grande demais e que isso pudesse pôr em causa o meu trabalho. Num congresso decidi contactá-lo e como tínhamos o mesmo tipo de abordagem entrámos muito rapidamente em sintonia intelectual. O meu primeiro artigo, o artigo que escrevi logo a seguir à tese, com parte dos seus resultados, foi assinado com este meu colega, e não com o meu supervisor. Na História das Ciências os supervisores de tese não costumam assinar os artigos. É uma maneira de funcionar muito diferente da dos cientistas. Aqui, o orientador da tese quase sempre assina os artigos dos alunos. Na História das Ciências não há essa política, não há essa tradição, e portanto, assina ou não assina consoante o envolvimento vai para lá daquilo que é normal um orientador fazer por um aluno.

Eu já trabalho com este meu colega há 18 anos e sempre nos demos muito bem do ponto de vista intelectual. Cada vez que queremos escrever um artigo ou fazer uma comunicação, através de telefonemas, emails ou Skype, trocamos ideias. Encontramo-nos em congressos, duas ou três vezes por ano, uma no mínimo. As coisas têm funcionado muito bem, dividimos tarefas. Em História das Ciências a tradição é semelhante à da História. A maioria das pessoas publica sozinha, o que também mais uma vez é algo diferente das Ciências, onde há muitos artigos assinados pelo orientador e pelos alunos, pelo grupo. Isso em História não é tão vulgar. Agora há uma jovem geração de historiadores das ciências - em Portugal, em Espanha, numa série de países -, que está não só a desenvolver trabalhos originais, trazendo para o centro as contribuições desses países, que muitas vezes ficaram de fora, como está a trazer também maneiras de trabalhar diferentes, e portanto, agora, já vemos muitas vezes artigos assinados por duas ou três pessoas. Aqui, no Centro Interuniversitário de História das Ciências e Tecnologia, que de momento coordeno, nós fazemos muito isso. Eu sempre trabalhei muito em conjunto mas também publico individualmente, e não vejo que isso seja um problema. Eu tenho com este meu colega e mais duas colegas portuguesas, e outros colegas gregos, um artigo assinado por nove pessoas. Temos insistido nesta tónica. É possível e é interessante e pode ser mais estimulante intelectualmente trabalhar em conjunto. Claro que é mais difícil, as pessoas têm pontos de vista diferentes e é preciso articular esses pontos de vista. A História das Ciências tem um trabalho de interpretação muito importante, e portanto, quando as interpretações são diferentes, as pessoas entram em conflito intelectual e às vezes não é fácil sarar esses conflitos, às vezes aliás, não se conseguem ultrapassar. Não é trivial fazer esse trabalho, mas quando ele é bem sucedido é uma mais-valia incrível.

Pode apresentar-nos esta obra? O que é que ela trata? O que é que a distingue?

AS – Esta obra é o primeiro livro que se escreve sobre a  emergência de uma disciplina chamada Química Quântica e resulta do trabalho que eu e este meu colega fizemos ao longo destes 18 anos.

A Química Quântica é uma disciplina que surge em finais dos anos 20 na interface entre a Química e a Física. O que nós discutimos neste livro é que não houve nada no início da disciplina que fizesse com que a Química Quântica estivesse necessariamente associada à Química. A disciplina foi iniciada por físicos alemães que na verdade lançaram uma área e depois basicamente ficaram bloqueados e depois  são uma série de cientistas americanos, que vão ser bem-sucedidos nos primeiros anos do desenvolvimento da área. O que nos interessou foi perceber como é que diferentes grupos, diferentes olhares sobre a Ciência, diferentes culturas científicas contribuíram para esta área, porque é que umas foram bem-sucedidas e outras foram mal sucedidas.

Um aspeto muito interessante ocorreu no pós-guerra e está associado à revolução que esta área sofreu com o aparecimento dos computadores, para os quais os químicos quânticos são muito importantes. Eles colaboraram mesmo no desenvolvimento do hardware e do software. A Química quântica é  uma disciplina tipicamente do século XX. É uma disciplina que vai nascer e expandir-se entre disciplinas já estabelecidas, como a Química, a Física, a Matemática, a Biologia. Nós tratámos os primeiros 50 anos da disciplina e tentámos perceber as diferentes culturas que se formaram e que deram identidade a essa disciplina, identidade essa que se foi transformando ao longo do tempo.

Imagens relacionadas com a Química Quântica
Pormenor da capa do livro “Neither Physics nor Chemistry: A History of Quantum Chemistry”

 

Existiram contributos importantes em Portugal?

AS – As pessoas que fazem Química Quântica em Portugal fazem-na numa fase que já é uma fase de maturidade disciplinar.

Nestes primeiros 50 anos, que foram 50 anos fundacionais, discutiram-se metodologias e estabeleceu-se uma identidade, que não passava pela identidade dos físicos. Um dos aspetos mais interessantes desta disciplina é que os físicos, que começaram a trabalhar nela, pensaram que se eles fossem capazes de resolver a equação de Schrödinger para moléculas, a Química perdia a sua identidade própria, passava a ser uma espécie de área da Física Aplicada. Esta ambição exprime a mentalidade típica dos físicos, reducionista. Essa tentativa foi um fracasso total, e portanto, é muito interessante perceber como é que um químico pensa e como é que ele pensa de maneira diferente de um físico; como é que um químico com uma forte formação matemática pensa e pensa diferente de um químico tradicional ou de um físico. Esta história tem uma interface muito grande com questões de Filosofia das Ciências, tais como as questões do reducionismo, do papel das imagens no desenvolvimento de uma área, por aí adiante.

Quanto à importância dos portugueses nestes primeiros 50 anos, não há propriamente nenhum participante. Ao nível destes primeiros 50 anos os participantes foram primeiro alemães, depois americanos, mais tarde ingleses e só no pós-Guerra é que entraram em cena os franceses e os suecos. A internacionalização da disciplina fez-se com o Pós-Segunda Guerra Mundial. Até aí era um núcleo constituído por americanos e ingleses.

Esta obra publicada pelo MIT Press recebeu elogios de pessoas que importa ouvir. O que é que tem a dizer sobre essas opiniões que foram publicadas?

AS – Um livro que sai no MIT Press passa por um processo muito longo. Submetemos um projeto, relativamente contido, com cerca de dez páginas, ao editor da coleção Transformations: Studies in the History of Science and Technology, que é uma coleção muito conceituada. Ao ser aprovado tivemos um prazo para entregar o manuscrito. O manuscrito passou por um conjunto de referees, tal e qual como se fosse um artigo. Tivemos colegas que consultámos a título individual, que nos deram uma série de conselhos e se deram ao trabalho de ler as mais  de 300 páginas que escrevemos e depois houve referees oficiais entre os quais se encontram a Mary Jo Nye, neste momento uma professora emérita e uma conhecidíssima historiadora da química, o Helge Kragh, que é um historiador das ciências dinamarquês também muito conceituado e o Silvan S. Schweber, um ex-professor de Física, discípulo do famoso Richard Feynman, que numa determinada fase da sua carreira se transformou em historiador das ciências. Estamos a falar de três estudiosos que são historiadores das ciências de primeira grandeza, que fizeram um refereeing rigoroso, algumas sugestões de alteração e comentários extremamente positivos.

É a primeira vez que se faz um livro sobre a história desta disciplina, e esta disciplina é uma disciplina exemplar, se quisermos estudar disciplinas que se desenvolveram essencialmente no pós-Guerra, no século XX. As interfaces que nós fizemos entre a História e a Filosofia das Ciências foram também muito apreciadas. Uma revista que se chama Metascience está a organizar uma espécie de um simpósio virtual, em que foram convidados historiadores e filósofos das ciências que vão produzir um texto, um comentário crítico sobre este livro, ao qual depois os autores hão-de responder. Portanto, acho que tem tido um impacto muito grande. Começaram a sair as primeiras book reviews e, até agora, os comentários destas pessoas são bastante elogiosos.

Ana Subtil Simões, Gabinete de Comunicação, Imagem e Cultura da FCUL
info.ciencias@fc.ul.pt
Mulheu a tapar o rosto

"Quando o medo de falhar deixa de ser tolerável, geralmente surgem sensações que geram tanto desconforto na pessoa, ao nível físico e psicológico que conduzem à adoção de estratégias menos saudáveis na gestão desse medo. Assistimos a dois grandes grupos de estratégias: o controlo e o evitamento", escreve a psicóloga Andreia Santos.

Primeira estrutura móvel com posto de colheitas biológicas está instalada no exterior do campus da Ciências ULisboa, entre o edifício C6 e a Faculdade de Letras da ULisboa

A primeira estrutura móvel com posto de colheitas biológicas no âmbito do projeto FIGHT COVID, lançado recentemente pela Faculdade e pela SGS Portugal, parceiras desde 2015, está instalada no exterior do campus da Ciências ULisboa, entre o edifício C6 e a Faculdade de Letras da ULisboa. 

Pódio

Em Portugal, a ULisboa continua a ser a universidade líder do Performance Ranking of Scientific Papers for World Universities 2020, mais conhecido por National Taiwan University (NTU) Ranking, que avalia o posicionamento das universidades de acordo com a respetiva produtividade, impacto e excelência dos artigos científicos produzidos em 24 áreas do saber.

chicken tractor

Afonso Ferreira, Florian Ulm, Francisco Azevedo e Silva, Inês Afonso e Tomás Simões apresentam o projeto “CHILL - CHIcken Tractors as an efficient and sustainable Link in closed Loop agriculture”. 

Ricardo Lima investiga em São Tomé e Príncipe

“(…) Se há algo de que não me arrependo foi em ter seguido este sonho de estudar Biologia. Nestes tempos de incertezas, se há algo que faz sentido é persistirmos numa profissão que nos satisfaz”, expressa Ricardo Lima, alumni da Faculdade e investigador do cE3c.

Logotipo

Nona rubrica Radar Tec Labs, dedicada às atividades do Centro de Inovação da Faculdade. A empresa em destaque é a FibFormula.

Universo

Assista ao Dia da Investigação da Ciências ULisboa transmitido pelo canal YouTube desta faculdade e fique a par da investigação de ponta e do importante papel que a Faculdade tem tido na transferência do conhecimento para a sociedade, na sustentabilidade e no combate à COVID-19.

Campus Ciências

Patrícia Tiago e Sergio Chozas, investigadores do cE3c Ciências ULisboa, apresentam o +Biodiversidade@CIÊNCIAS, um projeto que pretende aplicar o conceito de sustentabilidade nos espaços verdes da Ciências ULisboa e caracterizar e monitorizar a sua biodiversidade ao longo do tempo, envolvendo tanto a comunidade da Faculdade como os cidadãos que vivem e trabalham na área.

Esquema do vaso

Um grupo de guardiões da HortaFCUL realizou várias oficinas intituladas “Permacultura de Levar para Casa” no Centro Cultural de Belém, integradas na exposição “Agricultura e Arquitetura: Do Lado do Campo”. Durante a exibição da exposição, realizaram-se 24 oficinas, abrangendo um total de 500 alunos de diversas idades, desde a pré-primária ao 9º ano de escolaridade (dos 4 aos 14 anos).

Pormenor do Estudo em fio dos Painéis de São Vicente, por Almada Negreiros (1950)

Pedro Freitas, professor do Departamento de História e Filosofia das Ciências e investigador do Centro Interuniversitário de História das Ciências e da Tecnologia, escreve sobre Almada Negreiros, figura maior da cultura portuguesa do século XX.

abutre

"Centenas de cadáveres destes abutres encontravam-se sem cabeça, empilhados e intencionalmente escondidos sob arbustos", escreve Mohamed Henriques, doutorando do programa doutoral Biologia e Ecologia das Alterações Globais, juntamente com outros investigadores e conservacionistas numa carta publicada em outubro na Science.

O Dia da Investigação acontece a 28 de outubro de 2020

O Dia da Investigação acontece a 28 de outubro e será transmitido através do canal YouTube da Ciências ULisboa, anuncia a Faculdade em comunicado de imprensa. Consulte o programa e saiba quais são os temas em análise e os oradores das várias sessões, inscreva-se no evento e para ter uma ideia do que o espera assista à reportagem.

Flávio Gomes Oliveira a verificar se as armadilhas capturaram algum musaranho

Flávio Gomes Oliveira, doutorando do programa doutoral em Biologia e Ecologia das Alterações Globais, é um dos autores de um estudo publicado em outubro na Behavioral Ecology, cujos resultados integram a sua tese de doutoramento. Nesta entrevista o jovem investigador faz um balanço dos primeiros anos do doutoramento e deixa conselhos para quem quer seguir esta área.

Musaranho-de-dentes-brancos a ser devolvido à natureza

Um estudo realizado em Lisboa por um grupo de investigadores do CESAM, polo da Ciências ULisboa e da Universidade Adam Mickiewicz de Poznań, na Polónia, detetou diferenças substanciais no comportamento e metabolismo dos musaranhos-de-dentes-brancos que ocorrem na capital portuguesa, quando comparados com indivíduos provenientes de áreas naturais.

Emmanuelle Charpentier e a Jennifer Doudna

Este ano, o Prémio Nobel da Química foi atribuído às cientistas Emmanuelle Charpentier e Jennifer Doudna pelo "desenvolvimento de um método de edição do genoma", denominado CRISPR/Cas9. Leia o artigo da autoria de Lúcia Santos e Madalena Pinto, estudantes de doutoramento no polo da Faculdade do BioISI e Federico Herrera, professor do Departamento de Química e Bioquímica e investigador do BioISI.

Chuva intensa

Um estudo publicado na Nature Communications revela um aumento significativo da quantidade de humidade proveniente das regiões fornecedoras de água precipitável, água transportada até aos continentes pelos chamados rios atmosféricos (ARs).

Logotipo dos Prémios Científicos ULisboa/Caixa Geral de Depósitos 2019

A cerimónia de entrega dos Prémios Científicos ULisboa/CGD 2019 estava prevista para 20 de outubro, na Reitoria da ULisboa, mas face à evolução da pandemia da COVID-19 e na sequência da resolução do Conselho de Ministros emitida recentemente, a cerimónia será adiada para data a anunciar quando as condições de segurança estejam novamente reunidas. Das 30 distinções desta última edição, cinco são para professores e investigadores da Ciências ULisboa.

Roger Penrose, Reinhard Genzel e Andrea Ghez

O Prémio Nobel da Física 2020 distingue um dos teóricos mais distintos dos últimos 60 anos, o matemático e físico sir Roger Penrose e os astrónomos Reinhardt Genzel e Andrea Ghez, que revelaram a presença de um buraco negro extremamente massivo na região central da Via Láctea. Leia o artigo dos cientistas José Pedro Mimoso e Nelson Nunes, em colaboração com José Afonso e António Amorim.

Imagem abstrata

Ciências ULisboa integra a Rede de Inovação da Imprensa Nacional-Casa da Moeda (INCM), cujo objetivo é promover a ponte entre a investigação produzida em ambiente académico e o contexto industrial e empresarial.

Logotipo Radar Tec Labs

Oitava rubrica Radar Tec Labs, dedicada às atividades do Centro de Inovação da Faculdade. A empresa em destaque é a QPLab.

Campus da Ciências ULisboa

Ciências ULisboa volta a preencher a totalidade das vagas, no âmbito da 1.ª fase do Concurso Nacional de Acesso (CNA) ao ensino superior: 1001 candidatos conseguiram colocação nas 13 licenciaturas e nos três mestrados integrados desta faculdade, 449 como 1.ª opção. O número de vagas aumentou na maioria dos cursos, assim como as notas dos últimos alunos colocados nesta 1ª fase.

Cidade

Melhorar o funcionamento e a otimização energética de edifícios e equipamentos, resolvendo algumas das suas limitações, é um dos objetivos do projeto “Self Assessment Towards Optimization of Building Energy (SATO)”, liderado pela Ciências ULisboa e que tem início marcado para o próximo mês de outubro. O projeto integra 16 parceiros europeus da academia e dos sectores público e empresarial e representa a primeira grande colaboração científica entre o LASIGE e o IDL.

Papéis, canetas e braços

Vários alunos da Ciências ULisboa, da Universidade do Algarve (Ualg) e da Faculdade de Medicina Dentária (FMD) da ULisboa apresentaram este verão projetos de iniciação à investigação, desenvolvidos no âmbito da iniciativa “Sê Investigador por Três Semanas!”, promovida pelo Centro de Estatística e Aplicações da Universidade de Lisboa (CEAUL), com o objetivo de cativar os jovens para esta atividade.

cabra-montês

Dezenas de cientistas, técnicos e vigilantes da natureza do ICNF - Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, bem como cidadãos uniram-se em prol do novo Livro Vermelho dos Mamíferos de Portugal continental. O objetivo é melhorar até 2021 o conhecimento destas espécies e dessa forma contribuir para o estabelecimento de medidas e ações de conservação.

Imagens de perfil de 19 cientistas

Entre março e julho deste ano, as redes sociais da Faculdade deram a conhecer 19 pessoas e histórias de investigação, no âmbito da iniciativa “O que faço aqui?”, disponível no site da Faculdade.

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