Aluno de doutoramento em Biologia lidera investigação publicada na revista Animal Cognition

Pela primeira vez, chocos apresentam a capacidade de aprendizagem social

 olho de choco

Close-up de um olho de choco

Jorge Hernández Urcera

Os cientistas avaliaram o potencial de aprendizagem social antes da maturação neural (choco recém eclodido, até cinco dias) num teste standard de avaliação de aprendizagem e memória e exploraram ainda mais a plasticidade neural destes invertebrados, já que os chocos normalmente eclodem juntos.

Os resultados dos testes mostraram que os observadores precisaram de menos tempo e exibiram menos comportamento predatório do que os demonstradores. Em 70% dos casos, os observadores não atacaram o tubo em nenhuma tentativa. Adicionalmente, o facto de os animais verem ou não o estímulo antes de serem testados não fez diferença. Apesar do estado ainda imaturo das principais áreas cerebrais, os chocos recéns eclodidos são capazes de aprender através de emulação, um mecanismo cognitivamente mais complexo de aprendizagem social, sustentada num processo de "aprender o quê" em vez de "aprender como” e posteriormente executar tarefas cognitivamente muito exigentes (resultando na inibição do comportamento natural). Este processo ocorre num estágio da vida crítico, em que a possibilidade de contornar a prática de tentativa e erro para adquirir conhecimento do ambiente pode significar evitar situações em que o choco se tornaria a presa, conferindo uma vantagem evolutiva aos animais que incorporam informações fornecidas por outros indivíduos.

Chocos
Chocos recéns eclodidos no LMG
Fonte ES

A organização neural (partes do seu cérebro) dos chocos não está completamente desenvolvida até atingirem o estágio juvenil, aos 30 dias após a eclosão.

A aprendizagem pode ocorrer através de experiências próprias com o ambiente, com base na tentativa e erro. A aprendizagem social é uma forma mais complexa de adaptação ao ambiente e de aprendizagem através da experiência dos outros, por exemplo, por observação.

Fonte ES

Um grupo de investigadores da Ciências ULisboa a trabalhar no Laboratório Marítimo da Guia do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE) conseguiu mostrar que chocos acabados de eclodir (até cinco dias) são capazes de ter uma aprendizagem social.

Esta verificação de aprendizagem social nestes invertebrados é bastante relevante, uma vez que os chocos são animais maioritariamente solitários. Os chocos também demonstram uma enorme flexibilidade mental com apenas cinco dias de eclosão; o que lhes pode permitir evitar situações negativas sem terem que recorrer à experiência própria, com base na tentativa e erro levando assim a uma melhor adaptação ao ambiente.

O estudo "Neurally underdeveloped cuttlefish newborns exhibit social learning" publicado o mês passado na revista Animal Cognition tem como primeiro autor Eduardo Sampaio, estudante de doutoramento em Biologia (ramo Etologia) e conta ainda com a colaboração de Catarina S. Ramos, Bruna L. M. Bernardino, Maela Bleunven, Marta L. Augustin, Érica Moura, Vanessa M. Lopes e Rui Rosa, orientador de Eduardo Sampaio.

Estudar as capacidades sociais destes animais e os pontos anatómicos e comportamentais em comum com os vertebrados pode aprofundar o conhecimento sobre a origem e a evolução de cognição complexa e inteligência no reino animal.

As comparações cognitivas entre invertebrados (cefalópodes) e vertebrados com tamanho similar de cérebro relativamente ao corpo (peixes, répteis e mamíferos) são ainda hoje alvo de intenso debate. Há uma profunda divergência evolutiva de 600 milhões de anos entre os dois ramos.

Este trabalho corresponde a um modelo de evolução convergente: os cefalópodes revelam um enorme potencial de neuroplasticidade e flexibilidade comportamental, recursos fundamentais para uma rápida adaptação a mudanças e situações novas na natureza.

Rui Rosa, professor do Departamento e Biologia Animal e investigador no LMG e MARE salienta a importância deste trabalho, liderado pelo seu aluno: “pela primeira vez, invertebrados tipicamente não gregários, neste caso, chocos, apresentam a capacidade de aprendizagem social e em toda a ‘árvore da vida animal’, tal só estava documentado em invertebrados verdadeiramente sociais (e.g. abelhas, formigas), e, claro, em vertebrados”, acrescentando que este resultado ainda é mais relevante na medida em que foi descrito num estado muito inicial da ontogenia (desenvolvimento), ou seja os organismos ainda não tinham o seu sistema nervoso completamente maturo.

Eduardo Sampaio iniciou o doutoramento na Faculdade em outubro de 2017, coincidindo com o período de início da bolsa da Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Mais tarde, com a inclusão de um novo coorientador- Simon Gingins -, também ficou afiliado ao Max Planck Institute of Animal Behavior.

O trabalho de Eduardo Sampaio foca-se primariamente na exploração de cognição complexa em cefalópodes, e aspetos da caça colaborativa destes animais com peixes, como é o caso do movimento coletivo, sinalização interespecífica e cognição social. O jovem concluiu a licenciatura e o mestrado em Ecologia e Biologia Marinha no Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar da Universidade do Porto e atualmente é explorador da National Geographic Society. Na entrevista que se segue dá a conhecer outros pormenores da sua experiência académica.

“Novas descobertas podem ter um grande impacto na maneira como percecionámos e entendemos o mundo à nossa volta.”
Eduardo Sampaio

Eudardo Sampaio
Eduardo Sampaio

Porque escolheu esta área?

Eduardo Sampaio (ES) - Antes de decidir seguir um doutoramento, que envolve um grau alto de compromisso, quis experimentar várias bolsas de investigação em diferentes áreas científicas. Numa das últimas experiências comecei a trabalhar com o meu orientador atual – professor Rui Rosa -, que me deu a oportunidade de perseguir qualquer área para um doutoramento, desde que me sentisse particularmente interessado e desafiado. Assim, escolhi cognição e comportamento animal (com um foco em cefalópodes; um fascínio já antigo e também partilhado com o meu orientador) porque é uma área constantemente em evolução, em que novas descobertas podem ter um grande impacto na maneira como percecionámos e entendemos o mundo à nossa volta. No caso desta publicação mais recente, acrescentámos peso ao argumento que organismos filogeneticamente distantes e com uma estrutura cerebral muito diferente dos vertebrados, desenvolveram processos cognitivos similares, neste caso de forma a obter informação através de pistas sociais.

Como está a correr esta experiência?

ES - Está a ser um percurso exigente, mas muito recompensador. Decidimos integrar novas metodologias quantitativas, em experiências e no campo, que nos permitem analisar dados experimentais e eventos de história natural com uma resolução que até agora era rara. Para conseguirmos implementar estas técnicas, frequentei vários cursos e summer schools não só centrados em Biologia e Etologia clássica, mas em disciplinas em que tinha poucas bases científicas, como a Neurociência, Programação e Física. Paralelamente, tornei-me também explorador da National Geographic devido ao trabalho de campo focado em grupos constituídos por um polvo e vários peixes, em que existe caça colaborativa. Nestes grupos interespecíficos, estamos a analisar como as estratégias das diferentes espécies se complementam no ambiente natural, e descortinar quais as regras sociais e dinâmicas de teoria de jogos existentes. Tivemos colaborações importantes com outros institutos, tanto na teoria como na aplicação de conceitos, e no geral senti uma grande aprendizagem multidisciplinar ao longo do percurso. Tendo em conta os vários tópicos abordados e vivências durante o doutoramento, sem dúvida que tem sido uma experiência muito enriquecedora.

Eduardo Sampaio
Eduardo Sampaio

Que planos tem para curto/médio prazo?

ES - Neste momento, a um ano e alguns meses do fim do doutoramento, estou completamente focado em terminar os trabalhos que tenho em mão, porque sinto que apenas dessa forma conseguirei obter os melhores resultados. Tenho, no entanto, a certeza que no futuro quero continuar a fazer investigação na área de comportamento animal.

Scripta Manent. O que se escreve, fica, permanece. Leia o artigo "Cefalópodes e Inteligência: o Caso do Choco Social" da autoria de Eduardo Sampaio e publicado recentemente na National Geographic.

Ana Subtil Simões, Área de Comunicação e Imagem Ciências ULisboa
info.ciencias@ciencias.ulisboa.pt

"Este acontecimento é uma oportunidade para divulgar e celebrar a qualidade da investigação e da inovação desenvolvidas na Ciências ULisboa”, diz Margarida Santos-Reis, subdiretora da Faculdade para a área da investigação, a propósito da 5.ª edição do Dia da Investigação e Inovação.

imagem gerada por IA

"A realização de determinadas funções biológicas é explicada como efeito de uma “computação natural” executada pelo organismo. O objetivo destes programas é, como bem exemplificado por este recente artigo de Joshua Bongard e Michel Levin, promover uma confluência entre biologia e engenharia", escreve Lorenzo Baravalle, investigador do Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa.

pessoas a escavar na terra

Pegadas de dinossauros com 195 milhões de anos foram descobertas em Alvaiázere, no distrito de Leiria, sendo as mais antigas da Península Ibérica, segundo estudo publicado na revista científica Historical Biology. Carlos Neto de Carvalho, investigador do Instituto Dom Luiz, é um dos autores do trabalho.

Anfiteatro com pessoas

A 4.ª edição do acontecimento organizado pela Associação Portuguesa de Estudantes de Física (Physis), em colaboração com IA Ciências ULisboa e o Núcleo de Física e de Engenharia Física (NFEF) da Ciências ULisboa começou esta sexta-feira, dia 13 de outubro, no campus da Faculdade e termina este domingo, dia 15. Um dos pontos altos do programa é o debate “Há futuro na exploração espacial?”.

anffiteatro com cientistas

A Ciências ULisboa conta com 26 investigadores colocados nos rankings “World’s Top 2% Scientists”, de acordo com o mais recente estudo publicado pela Elsevier, comprovando a relevância da sua produção científica.

Laureados com o Nobel da Química

O Nobel da Química de 2023 foi atribuído conjuntamente a Moungi G. Bawendi, Louis E. Brus e Alexei I. Ekimov, pelo trabalho que levou à descoberta e ao desenvolvimento de pontos quânticos, nanopartículas tão minúsculas que o seu tamanho determina as suas propriedades, segundo comunicado oficial da Real Academia das Ciências da Suécia.

rato

O estudo “Resistência a rodenticidas anticoagulantes desafia esforços do controlo de pragas em Portugal” - realizado por uma equipa de investigadores do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar – visa recolher informações que tornem a gestão do ratinho doméstico mais eficiente, minimizando os seus impactos.

Katalin Karikó e Drew Weissman

A 2 de outubro de 2023 o Prémio Nobel da Fisiologia e Medicina foi atribuido a Katalin Karikó e Drew Weissman por descobertas biotecnológicas subjacentes à formulação das vacinas de mRNA (RNA mensageiro) para COVID-19. Em todo o mundo, mais de três mil milhões de pessoas receberam pelo menos duas doses destas vacinas (vacinas Comirnaty da Pfizer e Spikevax da Moderna). Em Portugal, cerca de sete milhões de pessoas receberam pelo menos três doses.

Pierre Agostini, Ferenc Krausz e Anne L'Huillier

O Nobel da Física de 2023 foi atribuído a três físicos europeus - Pierre Agostini, Ferenc Krausz e Anne L'Huillier -, a trabalhar nos EUA, Suécia e Alemanha. Reconhece os trabalhos pioneiros relativos à produção de luz decorrentes da interacção entre electrões e atómos foto-ionizados por laser, através da geração de um número elevado de harmónicas de ordem elevada que, em conjunto, e em condições de fase relativas adequadas (phase matching) podem dar origem a trens de impulsos luminosos com durações de ato-segundo (1 as = 10-18 s).

Centro de Congressos de Lisboa com vários participantes do EUPVSEC 2023

A 40th European Photovoltaic Solar Energy Conference and Exhibition - EUPVSEC 2023 realizou-se de 18 a 22 de setembro de 2023, no Centro de Congressos de Lisboa. João Serra, professor do Departamento de Engenharia Geográfica, Geofísica e Energia da Ciências ULisboa, foi novamente convidado a ser o chairman da maior e mais importante conferência europeia dedicada à energia fotovoltaica.

obra de Wassily Kandinsky

"Descobertas recentes na neurociência cognitiva - por António Damásio, Vittorio Gallese e Frans de Waal, entre outros - posicionam a empatia como um facto neurobiológico", escreve Graça P. Corrêa, investigadora do Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa.

pessoas numa escavação numa jazida de fósseis

Novo estudo publicado na revista Zoological Journal of the Linnean Society descreve um novo dinossáurio saurópode que viveu na Península Ibérica há 122 milhões de anos. Esta nova espécie de dinossáurio, apelidada de Garumbatitan morellensis, foi descrita a partir de restos descobertos em Morella (Castelló, Espanha) por uma equipa de paleontólogos portugueses e espanhóis e permitiu ampliar a diversidade de dinossáurios conhecida num dos melhores registos fósseis do Cretácico Inferior da Europa.

sensor de radiação no topo de um veículo

Um novo estudo desenvolvido por investigadores da Ciências ULisboa e do Instituto Dom Luiz com a colaboração de parceiros em França (Mines Paris - PSL) e Luxemburgo (LIST), publicado na revista Progress in Photovoltaics: Research and Applications, explora o potencial em ambiente urbano de veículos solares em 100 cidades em cinco continentes.

auditório lotado

18 de setembro foi o primeiro dia de aulas para mais de 800 novos alunos matriculados nas licenciaturas da Ciências ULisboa na 1.ª fase do Concurso Nacional de Acesso. A sessão de boas-vindas aos novos alunos decorreu às 11h30, no auditório 3.2.14.

Luís Fernando Marques Mendes foi um biólogo inteiramente dedicado à Entomologia, desde que se licenciou em 1971 pela Ciências ULisboa. Faleceu na passada quinta-feira, 14 de setembro, após prolongada doença. A Faculdade lamenta o triste acontecimento, apresentando as condolências aos seus familiares, amigos e colegas.

Laje rochosa - primeiras evidências de vertebrados do fundo do mar

A descoberta de fósseis extremamente raros, que representam as primeiras evidências de peixes de águas profundas, atrasa a invasão da planície abissal em 80 milhões de anos. Estas descobertas foram publicadas este mês num novo estudo na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS).

Grupo de pessoas

A 13ª Conferência Internacional SedNet - Continuum Sedimentar: aplicando uma abordagem de gestão integrada realizou-se na Ciências ULisboa, entre 5 a 9 de setembro. O programa intensivo de cinco dias começou com workshops sobre a gestão dos sedimentos a diferentes níveis, incluiu apresentações e uma visita de campo ao Porto de Lisboa e às dunas e praias de Cascais.

O Departamento de Matemática da Ciências ULisboa e o Museu Nacional de História da Ciência juntam-se numa homenagem que marca o centenário do nascimento do professor João Santos Guerreiro, a realizar no próximo dia 23 de setembro, entre as 14h00 e as 18h00, no Anfiteatro Manuel Valadares, no MUHNAC.

peixes

Os organismos estão a tornar-se mais pequenos através de uma combinação de substituição de espécies e mudanças dentro das espécies: trata-se da conclusão de um novo estudo publicado na revista Science, que analisou dados de todo o mundo dos últimos 60 anos e de diversas espécies de animais e plantas.

Filipe Rosas

​Filipe Rosas é o novo coordenador do Instituto Dom Luiz (IDL).

Susana Custódio com alunos

Portugal obteve uma medalha de prata e três medalhas de bronze na 16.ª edição da International Earth Science Olympiad (IESO 2023), que assinala a 8.ª participação portuguesa. A SGP e a CNOG agradecem à Faculdade o apoio científico prestado no âmbito do programa de preparação da equipa portuguesa para a 16.ª edição da IESO.

3 homens sentados

MARGINS surgiu com o objetivo de estudar as interações socioecológicas entre comunidades humanas e ambiente na zona costeira da Guiné-Bissau e compreender a inter-relação de arrozais e mangais como parte de uma unidade afetada pelas mudanças climáticas. No projeto estão envolvidos docentes, investigadores do IDL e cE3c e estudantes da Faculdade.

Auditório com pessoas

Este ano, na 1.ª fase do Concurso Nacional de Acesso ao ensino superior concorreram aos 16 cursos da Faculdade 5086 candidatos, tendo sido colocados 872 novos alunos em Ciências ULisboa, 527 em 1.ª opção. Até 5 de setembro decorre a apresentação da candidatura à 2.ª fase. A sessão de boas-vindas aos novos alunos de 2023/2024 acontece no dia 18 de setembro.

abelha mumificada

Um novo estudo publicado na revista internacional Papers in Paleontology dá conta da descoberta de centenas de abelhas mumificadas no interior dos seus casulos, num novo sítio paleontológico descoberto no litoral de Odemira.

mural

Há um novo mural no campus da Faculdade, para apreciar junto à FCULresta, que celebra os dois anos corridos desde a primeira semente lançada. "Só em Portugal, inspirados também pela FCULresta, foram criados ou melhorados um total de 6 espaços verdes resilientes" escrevem os responsáveis pelo projeto, neste artigo de opinião sobre a minifloresta. 

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