Entrevista com Armand Hernández

Terão sido os Açores povoados antes da data oficial da sua descoberta?

Equipa de investigação numa plataforma de perfuração na Lagoa Azul (Sete Cidades), efetuando as sondagens

Roberto Bao

Armand Hernández, investigador do Instituto Dom Luiz na Lagoa Azul (Sete Cidades)
Fonte Roberto Bao

Um estudo publicado na revista “Quaternary Science Reviews”, fruto de cinco anos de trabalho de investigadores portugueses e espanhóis, permitiu reconstruir a evolução da vegetação, paisagem e clima da ilha de São Miguel nos últimos 700 anos, através da análise dos sedimentos da Lagoa Azul.

Na entrevista que se segue, Armand Hernández, investigador do Instituto Dom Luiz fala sobre esse estudo e o resultado surpreendente que sugere alterações à data oficial da descoberta dos Açores.

Pode descrever o trabalho de campo efetuado neste estudo e as dificuldades que encontraram no decorrer do mesmo?

Armand Hernández (AH) - Fizemos a recolha de sedimentos do fundo da Lagoa Azul na ilha de São Miguel com uma plataforma de perfuração (como a das petrolíferas, mas de dimensões mais pequenas) e, com um sistema de recuperação de sedimentos, obtivemos um registo sedimentário que contém a história ambiental dos últimos 700 anos da ilha. A maior dificuldade residiu no facto de o sistema de perfuração utilizado (embora o melhor para este tipo de trabalhos) não ter permitido atravessar as cinzas vulcânicas da última erupção vulcânica nas Sete Cidades, sendo recuperados sedimentos relativos apenas aos últimos 700 anos. No entanto, estamos já a trabalhar com sedimentos da ilha do Pico que abrangem os últimos oito mil anos.

Qual a razão para a escolha dos Açores como local de estudo?

AH - O principal objetivo do projeto é a reconstrução da história climática do Atlântico norte. Os Açores constituem um lugar estratégico para atingir esse objetivo, uma vez que são um dos extremos da chamada Oscilação do Atlântico Norte (NAO), sendo este o padrão climático responsável em grande medida pelo clima no inverno na Europa. Neste trabalho, procurámos reconstruir esse padrão climático existente no passado, utilizando os sedimentos das lagoas dos Açores.

Vegetation and landscape dynamics under natural and anthropogenic forcing on the Azores Islands: A 700-year pollen record from the São Miguel Island” da autoria de Valentí Rull, Arantza Lara, María Jesús Rubio-Inglés, Santiago Giralt, Vítor Gonçalves, Pedro Raposeiro, Armand Hernández, Guiomar Sánchez-López, David Vázquez-Loureiro, Roberto Bao, Pere Masqué e Alberto Sáez foi publicado a 7 de fevereiro, na edição online e a 1 de março, no volume 159, páginas 155-168, da "Quaternary Science Reviews".

Quais foram as vantagens em trabalhar com um grupo tão multidisciplinar e internacional?

AH - Trabalhar em grupos grandes, multidisciplinares e internacionais tem vantagens e inconvenientes, mas neste estudo as vantagens sobrepuseram-se. Pessoalmente, sendo eu ainda um jovem investigador, pude aprender bastante com outros investigadores com mais experiência e de outras áreas de trabalho (Biologia, Geologia, Física, Química e Matemática). Além disso, a multidisciplinaridade da equipa permitiu atingir resultados mais amplos e robustos.

Quais foram os principais resultados alcançados?

AH - Antes de mais, gostava de salientar que continuamos a trabalhar nos Açores nestes últimos anos, tendo obtido amostras de sedimentos de São Miguel e Pico. Em junho de 2017 temos planeada uma terceira campanha para obter sedimentos das lagoas das ilhas Flores e Corvo. Na ilha do Pico obtivemos até oito metros de sedimentos que contêm a história ambiental dos últimos oito mil anos, mas ainda não temos resultados para apresentar. Os primeiros resultados estão a ser publicados agora e temos resultados no âmbito do clima, da vegetação (o presente estudo) e da introdução histórica pelos primeiros colonos de peixes nos ecossistemas lacustres. Um resultado importante é que estamos a perceber que o padrão da NAO não é o único padrão atmosférico que afeta significativamente o clima das ilhas dos Açores e que outros padrões não considerados até agora, aparentam ter um papel relevante.

Porque é que os resultados que obtiveram são relevantes para todos nós?

AH - Conhecer a nossa história é sempre relevante. Além disso, estudar tempos passados com condições ambientais (clima, vegetação, influência humana, etc.) semelhantes aos do presente, pode ser de grande utilidade para a previsão de mudanças ambientais no futuro. No contexto atual de aquecimento global, estudar o clima do passado ajudará a entender o clima do presente e do futuro. Contribuirá também para definir as medidas de prevenção e adaptação que devemos adotar, tanto no âmbito social como no económico.

Foi uma surpresa o resultado alcançado que indica que a ilha de São Miguel já era povoada antes da descoberta oficial dos Açores?

AH - Sim, até porque convém esclarecer que este não era um dos principais objetivos do projeto. Antes do início da investigação pensámos que poderíamos obter resultados relevantes pelo interesse histórico que pode ter uma região como os Açores. No entanto, obter um resultado que indica que a ilha foi povoada antes da descoberta oficial foi naturalmente uma importante surpresa.

Como foi feita a comparação dos dados que obtiveram com os dados históricos sobre os Açores?

AH - Foi feita uma leitura de uma grande quantidade de trabalhos recentes e antigos. Na ciência é muito importante consultar muita bibliografia de forma a permitir analisar os resultados obtidos numa perspetiva mais alargada. Além disso, os investigadores da Universidade dos Açores têm acesso a toda a literatura existente na ilha e contacto com as pessoas de maior conhecimento sobre a história dos Açores.

Quais as reações que têm tido aos vossos resultados e em particular ao inesperado resultado do possível povoamento dos Açores antes da data oficial?

AH - A publicação do trabalho é ainda muito recente e as reações apenas agora começam a chegar. Esperamos, como sempre acontece, que algumas pessoas acreditem no nosso trabalho e que outras se mostrem mais céticas. Vamos, por isso, continuar a trabalhar nos Açores, nomeadamente noutros lagos de outras ilhas, para poder confirmar e reforçar as nossas conclusões nos próximos anos.

Quais são os próximos passos?

AH - Neste momento, estamos a estudar oito metros de sedimentos das lagoas do Pico que contém a história ambiental dos últimos oito mil anos e também a trabalhar em mais algumas publicações científicas sobre São Miguel. No verão e no seguimento do trabalho de pesquisa de novos dados climáticos e ambientais, iremos recolher novas amostras de sedimentos nas ilhas das Flores e Corvo. Na minha opinião, o fundo das lagoas dos Açores reserva-nos ainda novas surpresas.

Marta Aido, Instituto Dom Luiz com ACI Ciências
info.ciencias@ciencias.ulisboa.pt
Combinação de imagens de técnicas e aplicações da Geodesia

"Um dos marcos interessantes da contribuição da Geodesia para a sociedade foi a definição do metro formulada em 1791 , que teve como base a medição do arco de meridiano entre Dunkerque e Barcelona, efetuada ao longo de sete penosos anos (em plena revolução francesa)", escreve Virgilio de Brito Mendes, professor do DEGGE Ciências ULisboa, por ocasião do centenário do curso.

Fluviário de Mora

A exposição permanente do Fluviário de Mora inclui “Sons dos Peixes” produzida no âmbito do projeto de investigação “Deteção de Peixes Invasores em Ecossistemas Dulciaquícolas através de Acústica Passiva - Sonicinvaders”, liderado pelo polo da Faculdade do MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente.

Modelo do espectrógrafo MOONS no VLT

Portugal colidera o projeto do Espectrógrafo Multiobjetos no Ótico e Infravermelho próximo, ou MOONS, assim como alguns dos seus grupos de trabalho. Um dos componentes principais do MOONS é o corretor de campo e foi desenhado por uma equipa do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço.

Planta

A fenotipagem (medição sistemática de caracteres fenotípicos, i.e., do corpo das plantas) foi eleita, depois dos grandes avanços verificados na fenotipagem nas últimas décadas, como um grande desígnio atual da comunidade da ciência das plantas. Leia a crónica da autoria de Jorge Marques da Silva, professor do DBV Ciências ULisboa e presidente da SPBP.

Vista aérea de florestas de mangal no arquipélago dos Bijagós

O estudo da autoria de Mohamed Henriques, José Pedro Granadeiro, Theunis Piersma, Seco Leão, Samuel Pontes e Teresa Catry realizado no ecossistema influenciado por mangal será publicado em julho deste ano no Marine Environmental Research, volume 169.

Cartas com Ciência

O conhecimento e a empatia não têm fronteiras, prova disso é o projeto Cartas com Ciência, que parte das palavras dos cientistas para criar laços e encurtar distâncias no que à educação diz respeito.

Satélite

"Com a Engenharia Geográfica/Geoespacial sabemos de onde vimos, para onde vamos, qual o melhor caminho e ainda o que vamos encontrar", escreve Paula Redweik, professora do DEGGE por acasião do centenário do curso.

Exposição “Empty space of the Unknown/ Nothing Is Right Now”

Catarina Pombo Nabais coordena o SAP Lab - Laboratório Ciência-Arte-Filosofia do Centro de Filosofia das Ciências da ULisboa e em entrevista dá conta da importância da relação interdisciplinar entre ciência e arte e dos projetos futuros.

Pepino do mar

Os pepinos do mar - espécies de equinodermes ainda muito desconhecidas - cumprem uma importante função ecológica: reciclam a matéria orgânica dos sedimentos e redistribuem nutrientes. O grupo de Pedro Félix, investigador do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE) e da Ciências ULisboa, é o único atualmente a trabalhar na ecologia e aquacultura de pepinos do mar em Portugal.

Anfiteatro com várias cadeiras e uma pessoa sentada a ler

O Grupo de Fala e Linguagem Natural dedica-se à Inteligência Artificial com enfoque especial no Processamento de Linguagem Natural e é o coordenador da PORTULAN CLARIN Infraestrutura de Investigação para a Ciência e Tecnologia da Linguagem.

cientista ao microscópio

Maria Helena Garcia, professora do DQB Ciências ULisboa e Andreia Valente, investigadora do DQB Ciências ULisboa, lideram A Something in Hands – Investigação Científica, Lda, uma spin-off desta Faculdade, que recebeu 100 mil euros da Portugal Ventures e que visa desenvolver novos medicamentos para o tratamento dos cancros metastáticos.

Centro de Testes Ciências ULisboa

O Centro de Testes Ciências ULisboa recebeu o primeiro lote de 110 zaragatoas a 1 de maio de 2020, provenientes de um conjunto de cinco lares de terceira idade do concelho de Mafra, no que viriam a ser os primeiros de várias dezenas de milhar de testes de diagnóstico molecular da COVID-19.

Logotipo Radar

Décima quinta rubrica Radar Tec Labs, dedicada às atividades do Centro de Inovação da Faculdade. A empresa em destaque volta a ser a Nevaro.

Há um conjunto de normas e princípios legais que regulam as relações dos indivíduos em sociedade. O direito de autor é um deles. Todo o conteúdo produzido e publicado em órgãos de comunicação social é considerado conteúdo editorial. Estas obras coletivas estão protegidas pelos direitos de autor.

Iris Silva

Iris Silva, investigadora do Instituto de Biossistemas e Ciências Integrativas (BioISI) na Ciências ULisboa, venceu pela segunda vez o Best Young Investigator Award da Sociedade Europeia de Fibrose Quística (ECFS), segundo comunicado de imprensa emitido esta sexta-feira pela Faculdade. O galardão será atribuído durante o 44th European Cystic Fibrosis Conference, que se realiza online entre 9 e 12 de junho de 2021.

Margarida Ribeiro e Hugo Anjos, alunos de Ciências ULisboa do mestrado em Bioestatística

Em reunião do Infarmed, os alunos Margarida Ribeiro e Hugo Anjos, do mestrado em Bioestatística, receberam palavras de agradecimento da DGS pelo trabalho desenvolvido em contexto COVID-19.

Pessoas a trabalhar numa mesa

O projeto SKIES (SKilled, Innovative and Entrepreneurial Scientists), iniciado em março passado e com a duração de 18 meses, pretende fornecer a estudantes de doutoramento e jovens investigadores doutorados na área da Astronomia um conjunto de competências ao nível da ciência aberta, inovação e empreendedorismo.

Tachydromia stenoptera

Ana Rita Gonçalves concluiu o mestrado em Biologia da Conservação na Ciências ULisboa e no âmbito da sua tese estudou a morfologia de todas as moscas-formiga conhecidas da Península Ibérica e de Itália - dez espécies no total. Quatro delas são novas para a Ciência e uma apenas existe em Portugal.

Imagem gráfica das comemorações do aniversário da Faculdade

Esta segunda-feira, dia 19 de abril, a Faculdade celebra 110 anos. Para acompanhar a cerimónia comemorativa que será realizada uma vez mais online no próximo dia 21 de abril, a partir das 14h00, deverá ligar-se ao canal YouTube.

Exposição Variações Naturais – uma viagem pelas paisagens de Portugal

Após 18 meses de desenvolvimento de projeto e montagem, Variações Naturais – uma viagem pelas paisagens de Portugal abriu portas ao público em novembro passado e vai estar em exibição até 25 de novembro de 2022.

ferramenta de saída de campo

Ícaro Dias da Silva recebeu uma menção honrosa na última edição (2019) dos Prémios Científicos ULisboa / Caixa Geral de Depósitos. O investigador do IDL Ciências ULisboa estuda a geodinâmica das margens continentais relacionadas com a abertura e fecho de oceanos no Paleozoico.

Barcos de pesca em Almograve, Portugal

No âmbito do projeto MarCODE já foram recolhidas mais de 1000 amostras de pescado e marisco - robalo, dourada, raia-lenga, pescada, carapau, polvo, cavala, ouriço e percebes. A amostragem decorreu nas lotas nacionais da DOCAPESCA. As amostras encontram-se a ser processadas analiticamente nos laboratórios do MARE e do BioISI, nos polos da Faculdade.

Imagem de mãos dadas

Até ao próximo mês de julho, cerca de 70 famílias de cuidadores informais no território continental português participam no programa “Famílias Seguras – Cuidar de quem Cuida” lançado pela Ciências ULisboa, através do seu Centro de Testes, em parceria com a Associação Nacional de Cuidados Informais.

Logotipo Radar

Décima quarta rubrica Radar Tec Labs, dedicada às atividades do Centro de Inovação da Faculdade.

Sala com microfone

O jornalismo científico tem a responsabilidade de tornar a mensagem científica compreensível para o público leigo. Jornalistas e cientistas têm o dever cívico de contribuir para a qualidade da informação.

Páginas