Alunos de Hidrografia fazem levantamento topo-hidrográfico na Praia de Santo Amaro

Trabalhos de campo na praia: vantagens de ser aluno de Engenharia Geoespacial na Ciências ULisboa

lancha hidrográfica leva os alunos para o rio

Este ano, os alunos de Hidrografia realizaram um levantamento hidrográfico com recurso a sonda multifeixe, um sistema recentemente adquirido pela APL

GJ Ciências ULisboa

Durante o mês de maio, uma turma de alunos do 3.º ano, finalistas do curso de Engenharia Geoespacial deslocou-se em trabalho de campo até à Praia de Santo Amaro, em Oeiras, para realizar um levantamento topo-hidrográfico da praia. O trabalho constitui o projeto final da disciplina de Hidrografia, ministrada pelo professor Carlos Antunes.

O trabalho tem como objetivo obter o modelo digital de terreno da praia emersa e submersa - modelo de batimetria -, de forma a obter um modelo 3D completo da praia para avaliação da sua morfodinâmica.

Acompanhámos os dois dias de visita - 3 e 17 de maio – para ficar a conhecer o trabalho que os alunos estiveram a desenvolver.

No primeiro dia, pelas 10h00, apesar do dia ser de maio e registar algum vento, o calor do sol convidava a um mergulho. O pequeno grupo de dez alunos vestidos com coletes verdes caminhava pelo areal, junto à margem. Dois deles afastaram-se do grupo, em direção a terra, transportando um bastão com cerca de dois metros de altura, no qual é montada uma antena e um recetor GPS a funcionar em tempo real com ligação a uma estação permanente via Internet móvel.

Os restantes aguardaram perto da margem, até os dois colegas se afastarem o máximo possível até aos limites da praia. Orientaram-nos à chegada do ponto pretendido, mantendo-os em linha reta, na mesma direção. A operação foi repetida ao longo de toda a praia, em intervalos de 20 em 20 metros, sendo os pontos do início dos perfis assinalados e numerados na areia, para mais tarde serem retomados na direção do mar. Assim fizeram os primeiros perfis transversais da praia emersa.

alunos na praia
O grupo percorreu toda a extensão da praia, perfazendo um total de 37 fiadas
Fonte GJ Ciências ULisboa

O trabalho realizou-se dividindo a praia em duas secções: uma parte superior - a zona dunar seca mais afastada da zona de maré - e uma inferior, a zona molhada mais perto da margem, a face-praia. Depois de concluída a parte superior, perto das 11h00, o trabalho continuou sobre a zona da face-praia, aproveitando a baixa-mar e de forma a cobrir o máximo de terreno emerso da praia. Novamente, o grupo percorreu toda a extensão da praia, recorrendo aos pontos marcados anteriormente, perfazendo um total de 37 fiadas.

professor a ajudar dois alunos com o equipamento
Carlos Antunes e dois alunos percorreram toda a extensão da praia para traçar perfis longitudinais
Fonte GJ Ciências ULisboa

Paralelamente foi feito um outro levantamento, seguindo um percurso paralelo à margem. Carlos Antunes e dois alunos percorreram toda a extensão da praia, traçando perfis longitudinais e cobrindo as extremidades da praia e as bermas quebradas em forma de pequenos taludes. A definição do trajeto a percorrer é feita de forma “mais ou menos intuitiva”, explica o professor, de maneira a registar as alternâncias do relevo da praia - linhas de quebra - da forma mais rigorosa possível.

Sara Pires, uma das alunas participantes na atividade, diz estar a gostar de fazer este trabalho de campo, e afirma a utilidade para o seu futuro profissional, uma vez que lhe permite ganhar autonomia face aos equipamentos.

 

Levantamento hidrográfico com sonda multifeixe

imagem de satélite e plano das fiadas
Imagem de satélite e plano das fiadas do levantamento hidrográfico
Fonte CA

O segundo dia de trabalho “meteu mais água” e houve até quem ficasse enjoado com a agitação marítima!  O objetivo passou por efetuar o levantamento hidrográfico da zona submersa, recorrendo à utilização de uma lancha hidrográfica da Administração do Porto de Lisboa (APL). Este levantamento foi feito durante a maré alta, de forma a que a lancha pudesse cobrir ao máximo a zona de praia e sobrepor-se aos perfis do levantamento topográficos antes recolhidos em terra.

dois alunos, o professor e a sua bicicleta
Na Marina de Oeiras, os alunos aguardaram a chegada da lancha hidrográfica da APL
Fonte GJ Ciências ULisboa

Nesse dia, Carlos Antunes chegou de bicicleta, utilizando-a para se deslocar rapidamente pelo paredão da praia, para melhor orientar os alunos na atividade.

Os trabalhos desenvolveram-se da seguinte forma: dois alunos foram na embarcação; quatro alunos ficaram na praia, juntamente com o professor, com a tarefa de registar pontos da trajetória do barco com interseção de visadas, recorrendo a dois teodolitos - foram divididos em dois grupos, dois de um lado e dois do lado oposto da praia, ficando o professor junto de um dos grupos.

Sara Pires e Miguel Lucas foram escolhidos para ir no barco a acompanhar os trabalhos, por sorteio entre os colegas da turma. Após uma breve caminhada chegaram à Marina de Oeiras.

À chegada, esperava-os o professor com a sua bicicleta, mas a lancha ainda não tinha chegado ao cais. A embarcação ainda se encontrava a fazer calibrações do sistema de sondagem multifeixe, um sistema de tecnologia avançada recentemente adquirido pela APL. A atividade foi duplamente importante e especial, pois constituiu uma nova experiência não só para os alunos, como também para os técnicos da APL, que o testaram pela primeira vez, esclarece o professor.

ilustração do sistema multifeixe
O sistema de levantamento hidrográfico com sonda multifeixe recorre a um sonar de múltiplos feixes acústicos para mapear o fundo do mar
Fonte British Antarctic Survey

O sistema de levantamento hidrográfico com sonda multifeixe recorre a um sonar de múltiplos feixes acústicos para mapear o fundo do mar, direcionados na forma de leque transversal à direção de deslocação da lancha. A profundidade da água é calculada através do tempo de percurso do sinal e da velocidade do som na água: o sistema emite uma onda sonora que reflete no fundo do mar e é captada pelo sensor na forma de um agregado de feixes múltiplos, permitindo assim calcular a profundidade da água simultaneamente num conjunto de pontos que formam um único perfil transversal.

Este é um sistema novo, tanto para a APL como para o grupo da Faculdade. O sistema anterior utilizava o feixe simples, um método que consiste na medição de um único feixe acústico vertical. O sistema agora adotado é mais rigoroso, uma vez que um único impulso permite adquirir vários feixes. Passar com o barco pelas fiadas permite fazer uma varredura do fundo marinho, tal como uma trincha a passar por uma parede. A localização das fiadas é previamente definida tendo em conta a abertura do feixe (leque), de forma a cobrir toda a zona e não deixando nenhuma zona por “varrer”. Esta técnica de varrimento cobre tudo o que existe no fundo marinho, sendo usualmente utilizada para análise de zonas de profundidade superior a cinco metros.

Sendo mais completo, o sistema comporta também mais exigências em relação ao sistema convencional de feixe simples. Por exemplo, contém mais sensores e duas antenas GPS (ao invés de uma); é necessário saber a velocidade de som da água ao longo das várias camadas, enquanto que na técnica de feixe simples basta saber a velocidade média; contém um sensor de movimento com acelerómetros para medir o movimento relativo da embarcação devido à agitação marítima; utiliza uma técnica de guiamento que corrige a direção do feixe em tempo real, tendo em conta a mudança de direção da embarcação.

Os levantamentos hidrográficos são importantes no Tejo, e em qualquer porto marítimo ou zona hidrográfica, nomeadamente para planificar e monitorizar as operações de dragagem das areias no fundo do rio, que ocorrem todos os anos, de forma a manter a cota de segurança do fundo e permitir a navegabilidade dos grandes navios.

Após o embarque, os dois estudantes e os três técnicos da APL percorreram as 24 fiadas inicialmente planificadas, fazendo o levantamento hidrográfico da praia.

Para Miguel Lucas, a sorte de ter sido escolhido para ir no barco foi “madrasta”. O jovem enjoou logo no início da viagem, tal era a agitação marítima nessa tarde. Apesar do contratempo, o aluno conta que a experiência foi “muito enriquecedora” pois permitirá ganhar bases para realizar trabalhos semelhantes no futuro, dentro da mesma área.

Em terra, sob comando de Carlos Antunes e recorrendo a intercomunicadores rádio, os alunos iniciaram os restantes trabalhos, acompanhando os movimentos da embarcação para determinar a sua posição rigorosa a cada 10 segundos. “Atenção… preparar… fora!” é a expressão mais usada por Carlos Antunes, sendo que a palavra “fora” é o sinal para que todos registem o ponto de localização da embarcação, naquele preciso momento. A hora em que é emitido o sinal é registada num computador portátil, cujo horário é aferido e corrigido via Internet. Todos os dados adquiridos pelos diferentes equipamentos devem estar perfeitamente sincronizados, de forma a que à posição exata da embarcação corresponda uma determinada profundidade, num mesmo instante.

“Atenção…preparar…fora!” é um sinal da Engenharia Geoespacial, herdado das técnicas mais antigas, quando medições semelhantes se faziam com recurso a uma bola de chumbo, que era mandada para fora do barco; ao mesmo tempo, a medição era feita em terra, com recurso a sextantes.

Dada a forte agitação marítima que se fazia sentir nessa tarde, não foi possível realizar a atividade na sua totalidade, uma vez que as fiadas finais eram muito próximas da praia e a lancha não conseguiria operar em condições de segurança.

Vasco Veiga e Carolina Cardoso, dois dos alunos que ficaram na praia, gostaram da experiência. Para Vasco Veiga, “é sempre bom ir ao terreno e experimentar os equipamentos é o mais cativante”. Ambos acreditam que esta experiência lhes deu autonomia, algo essencial para as vidas profissionais futuras. Os finalistas consideram o curso muito acessível, equilibrado e bem estruturado, sendo que um dos pontos positivos é a elevada taxa de emprego.

 

Monitorização da Praia de Santo Amaro ocorre desde 2012

modelos
Mapa do modelo topo-batimétrico com os pontos adquiridos (7930 pontos no total) e modelo 3D da topo-batimetria, com inclusão de pontos do sistema de feixe simples realizado em 2021, dada a impossibilidade de levantamento de todos os pontos da área submersa
Fonte CA

Os levantamentos feitos em terra e no mar constituiram peças fundamentais para construir a imagem final mais aproximada possível à realidade topográfica e morfológica da praia. A cobertura total da área a modelar só é possível com um bom planeamento das fiadas a realizar. Para obter um modelo 3D completo e sem falhas, são utilizados métodos topográficos de ligação à Rede Geodésica Nacional, uma infraestrutura que define o sistema de coordenadas e altitudes.

Este exercício de levantamento topo-hidrográfico da Praia de Santo Amaro é realizado nas aulas do professor Carlos Antunes anualmente desde 2012. Ao longo dos vários anos, a análise e comparação dos dados permite perceber que zonas da praia ganham e perdem mais areia, fruto do efeito energético das ondas. No futuro, os dados permitirão perceber a amplitude da perda de areal devido à subida do nível médio do mar.

aluno com teodolito
Os levantamentamentos topo-hidrográficos na Praia de Santo Amaro são feitos desde 2012
Fonte GJ Ciências ULisboa

Os dados têm demonstrado que, de forma geral, a dinâmica na praia de Santo Amaro é relativamente estável, não se registando alterações significativas na quantidade de areia disponível no sistema morfodinâmico da praia. Este evento deve-se ao facto de a praia se encontrar virada a sul e estar mais protegida (pelo Forte de São Julião da Barra) da influência da agitação marítima, predominantemente de noroeste. De forma natural, no inverno a praia perde alguma areia e no verão volta a ganhar, sendo que em anos de grandes tempestades este equilíbrio se altera ligeiramente.

O trabalho prático constitui a base para o projeto final da disciplina de Hidrografia, para o qual os alunos trabalham em grupo, no processamento dos dados e na elaboração de um relatório. No passado dia 22 de março a turma já tinha realizado um trabalho prático de preparação no campus da Faculdade, no jardim do edifício C8, onde aprenderam os procedimentos necessários para a realização de um levantamento topo-hidrográfico com os métodos clássicos de posicionamento da sondagem. A 19 de abril realizaram um outro exercício de treino na Estação Fluvial de Belém, este com o objetivo de determinar as posições dos barcos cacilheiros e outras embarcações que cruzassem o Tejo, a cada dez segundos.

Está disponível na página de Facebook da Faculdade a reportagem fotográfica desta atividade.

Marta Tavares, Gabinete de Jornalismo Ciências ULisboa
info.ciencias@ciencias.ulisboa.pt
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A crónica da autoria da Comissão de Imagem do Departamento de Informática da Ciências ULisboa visa realçar a investigação feita pelos docentes e investigadores deste departamento. A primeira dá a conhecer André Rodrigues.

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Carla Silva é professora no Departamento de Engenharia Geográfica, Geofísica e Energia e investigadora no Instituto Dom Luiz, no RG5 – Energy Transition. Este ano foi distinguida pela ULisboa e pela Caixa Geral da Depósitos com uma menção honrosa, na área de Engenharia do Ambiente e Energia. Leia a entrevista com a cientista e saiba o que pensa sobre esta distinção e em que consiste a sua investigação.

Rita Margarida Cardoso e membros da ULisboa e CGD

Rita Margarida Cardoso é investigadora no Departamento de Engenharia Geográfica, Geofísica e Energia e investigadora no Instituto Dom Luiz (IDL), no RG1 – Climate change, atmosphere-land-ocean processes and extremes. Este ano foi distinguido pela ULisboa e pela Caixa Geral da Depósitos (CGD) com uma menção honrosa, na área das Ciências da Terra e Geofísica. Leia a entrevista com a cientista e saiba o que pensa sobre esta distinção e em que consiste a sua investigação.

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Movimento de partículas ativas em meios desordenados

Sabia que quando um conjunto de robots ou bactérias se move num espaço onde há vários objetos livres, esses robots ou bactérias desviam esses objetos para poderem passar? Um grupo de investigadores da Ciências ULisboa e das universidades de College of London (Reino Unido) e de Gothenburg (Suécia) conseguiu mostrar que o rasto deixado por esse movimento contribui para a formação de grupos, funcionando como um mecanismo efetivo de comunicação entre eles.

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