Por Ana Sofia Alves (MARE, UÉvora).
As pradarias marinhas são ambientes estuarinos de excelência que funcionam como viveiros naturais de inúmeras espécies de elevada importância económica, particularmente de invertebrados e peixes. Esta característica impar traduz-se em enormes benefícios sócio-económicos para as populações piscatórias circundantes, que tradicionalmente vivem da apanha de marisco e da pesca. Ecologicamente, estes sistemas funcionam como filtros biológicos de nutrientes e poluentes, e desempenham ainda um papel fundamental no controlo da erosão costeira e no sequestro de carbono. Apesar do seu papel relevante, tem-se registado um decréscimo mundial das áreas de distribuição das pradarias marinhas, com fortes impactos nos ecossistemas, não só pela diminuição do habitat e diversidade, mas também pelas implicações causadas nas interações tróficas dos ecossistemas estuarinos.
No estuário do Rio Mira, incluído no Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, os povoamentos de Zostera noltii registaram um colapso total em 2008 e, apesar da recuperação natural que se tem observado, esta ocorre por impulsos intermitentes em áreas dispersas, registando-se uma tendência para a sua recuperação natural desde 2009. Neste local, a prática de apanha de moluscos bivalves para consumo humano e de poliquetas para pesca recreativa é frequente e intensa, sendo considerada, a nível global, uma das principais causas do declínio destas pradarias.
De entre as comunidades bentónicas existentes nos sedimentos, as comunidades de meiofauna e nemátodes têm um papel muito importante nos ecossistemas, estando envolvidas em processos de biomineralização de matéria orgânica, de regeneração de nutrientes, servindo de alimento para níveis tróficos superiores e exibindo uma elevada sensibilidade a perturbações ambientais. Recentemente o seu papel como indicador de qualidade ecológica e a sua integração em estudos de monitorização e impacto ambiental têm sido valorizados, sendo por isso essencial conhecer os padrões de distribuição destas comunidades.
Investigadores do MARE-Universidade de Évora têm acompanhado a recuperação natural das pradarias marinhas do estuário do Mira desde 2010, baseando-se nas respostas estruturais e funcionais das comunidades de nemátodes bentónicos para avaliar o estado dos povoamentos de Z. noltii. No âmbito do Projeto ProMira, coordenado pela Universidade de Évora (Nº31-03-02-FEP-006 do PROMAR) serão apresentados os resultados do estudo i) do efeito do marisqueio tradicional (perturbação física) na recuperação natural dos povoamentos de Z. noltii do estuário do Mira e ii) a relação entre o padrão de abundância e de biodiversidade das comunidades de meiofauna e de nemátodes bentónicos com a estado de recuperação natural dos povoamentos de Z. noltii.