Apresentação por José Félix Costa, no âmbito dos Seminários de Doutoramento do Programa de Doutoramento Internacional em Filosofia da Ciência, Tecnologia, Arte e Sociedade.
Neste seminário confronta-se o devaneio do labirinto, tal como descrito por Bachelard, com a solução científica do passeio labiríntico dada no século XIX, solução que foi, no entanto, ignorada pela obra literária dos séculos XIX, XX e pela já produzida no século XXI. Presente na literatura desde a Antiguidade, o conceito de labirinto preocupou filósofos, teólogos e matemáticos ao longo de 2500 anos. Do labirinto multicursal de Dédalo (da Eneida de Virgílio e das Metamorfoses de Ovídio, possivelmente da Ilíade de Homero e da Teogonia de Hesíodo) ao labirinto unicursal da Catedral de Chartres, da Divina Comédia de Dante e do Auto da Alma de Gil Vicente, do labirinto multicursal da Queste del Saint Graal de Albert Pauphilet (século XIII) ao labirinto de La biblioteca de Babel de Jorge Luis Borges e labirinto da consciência de Inception de Christopher Nolan, estabeleceram-se processos de crescimento individual que se desenrolam (que se desdobram) enquanto se caminha pelos meandros dos diversos labirintos enfrentando-se o si-mesmo – o verdadeiro Minotauro de Cnossos. (Teseu terá vencido a batalha no plano material, mas não a verdadeira batalha no plano psíquico.) Outro exemplos paradigmáticos de labirintos podem encontrar-se na literatura, inter alia nos romances The Woman in White de Wilkie Collins, Jane Eyre de Charlotte Brontë, Moby Dick de Herman Melville, Il Nome Della Rosa de Humberto Eco. Diz Bachelard que o labirinto é não mais que «Um sofrimento primário, um sofrimento da infância. Será um traumatismo de nascimento? Será, ao contrário, como acreditamos, um dos traços mais nítidos de um arcaísmo psíquico?»
Porém, damo-nos conta de que o labirinto que nos é familiar tem solução matemática simples, ignorada pelos autores. Mais, tem solução numa linguagem nova na Matemática do século XVIII, inesperadamente introduzida ad hoc por Leonhard Euler. Como é que um problema que tem solução matemática simples continua, na forma de problema insolúvel, a decorar o mundo da arte, da literatura e do cinema? É que atravessar o labirinto tornou-se uma metáfora de processos mentais e de aprendizagem dialética já descrita no Euthydemus de Platão, mas que não tem linguagem adequada na ciência contemporânea. A contradição é realçada por Bachelard quando diz que «… caminhar no bosque escuro ou na gruta tenebrosa, perder-se, estar perdido são situações típicas.